Atos como os que ocorreram
ontem em Fortaleza demonstram o grau de desenvoltura do crime organizado. Em resumo:
uma ordem partiu para que bandidos incendiassem ônibus em diversos pontos da
cidade. O suficiente para paralisar o sistema de transporte público, fechar
terminais e gerar o caos no funcionamento da cidade. Deu-se uma situação que
qualquer país civilizado do mundo trataria como um conjunto de atos terroristas
muito bem planejados. Não há outro termo para qualificar os acontecimentos.
O que aconteceu ontem em
Fortaleza? “Violência premeditada e politicamente motivada contra inocentes
perpetrada por grupos subnacionais ou agentes clandestinos”. Outra definição:
“ato perpetrado para provocar medo, coagir governos ou intimidar a sociedade”.
Precisamente, as duas definições são usadas pelo governo norte-americano para
classificar um ato terrorista. Pelo visto, tudo se enquadra no ocorrido em
Fortaleza.
É comum a caracterização do
terrorismo como ato motivado exclusivamente por desavenças políticas,
ideológicas ou religiosas. Mas, como classificar o terror instaurado na
Colômbia durante as décadas de 1980/90 pelos cartéis do tráfico de cocaína? Lá,
se chegou ao ponto de uma invasão da Suprema Corte, com incêndios e mortes, a
mando de Pablo Escobar. Bombas em aviões e assassinatos de policiais eram
comuns. Não havia questão nem política, nem ideológica e muito menos religiosa
envolvendo os casos. Porém, era terrorismo. Afinal, o alvo era o Estado.
A Colômbia atuava em duas
frentes de combate. Uma contra o narcotráfico e outra contra as Farc, guerrilha
que se dizia marxista. O caminho foi aprovar uma lei antiterrorista abrangente.
Na lista de ações classificadas como terrorista, a Colômbia incluiu: “provocar
estado de terror na população”, “colocar em perigo a vida, a integridade física
ou a liberdade de pessoas”, “perturbar os sistemas de transporte coletivo,
energia ou comunicações”, “propagar epidemias”, “contaminar águas” e até
“provocar inundações”. Bingo!
O caminho brasileiro foi frouxo
e dúbio. A lei do antiterrorismo aprovada no Congresso Nacional até que era
razoável, mas a então presidente Dilma Rousseff tratou de tirar seu ímpeto. O
texto final aprovado pelo Congresso recebeu oito vetos, entre eles o item que
classificava como atos terroristas ações como depredar, saquear, destruir ou
explodir meios de transporte, como ônibus e metrô além de estações, ou qualquer
bem público e privado, além de sabotar sistemas de informática e bancos de
dados. Pois é.
Tudo em nome dos ditos
movimentos sociais. Ou seja, em vez de se orientar os grupos que fazem
movimentos de rua, protestos e manifestações para que não depredem nem
incendeie ônibus, optou-se pela retirada desses atos da lista de terrorismo,
quando na verdade é de fato terrorismo. Originalmente, o sujeito preso
queimando ônibus ou depredando as vidraças do Congresso Nacional seria
enquadrado pela lei antiterrorismo. Com os vetos, fica tudo por isso mesmo.
E assim caminhamos. Um grupo de
facínoras afronta o Estado e a sociedade e estão protegidos por uma lei molenga
que não classifica como terrorismo o que terrorismo é. Sendo, poderia ser tratado
pela Polícia Federal. Mais: é muito provável que o comando da bandidagem tenha
utilizado menores nos atos organizados para queimar mais de uma dezena de
ônibus.
O Brasil virou isso: uma lei
supostamente criada para proteger os menores os transforma na mão de obra
preferida dos criminosos. Afinal, se pegos, não vão passar por julgamentos e
muito menos condenação. Aos 18 anos, esse menor que queimou o ônibus vai ter
sua lista de crimes apagada.
(Por Fábio Campos, no O POVO de hoje)