Deputados federais enviaram emendas de transferência especial – as conhecidas emendas Pix – para prefeituras chefiadas por parentes. A fatia do orçamento público destinada pelos parlamentares às unidades estaduais comandadas pelos próprios pais, filhos, irmãos ou cônjuges já ultrapassou a casa dos R$ 171 milhões em 2024.
A situação se repete em 20 municípios, mas o destaque fica com Coari, no interior do Amazonas. Em 2024, a cidade recebeu R$ 18,4 milhões em emendas Pix por indicação de Adail Filho (Republicanos). Ocorre, entretanto, que o deputado e o prefeito Keitton Pinheiro (PP) são primos.
Emenda Pix é o nome dado à modalidade que permite a transferência direta de verbas da União aos estados e municípios, sem a necessidade de formalização prévia de convênios, apresentação de projetos ou aval técnico do governo federal. A modalidade atingiu volume recorde em 2024 e ganhou prioridade na liberação, em razão do ano eleitoral.
Quatro deputados do Ceará são citados pela reportagem do Metrópole, que fez o levantamento dos dados relativos ao pagamento das emendas parlamentares de transferência especial do portal Siga Brasil. São eles: Domingos Neto (PSD); Robério Monteiro (PDT); Eduardo Bismarck (PDT); e Junior Mano (PSB).
Domingos Neto enviou R$ 10.085.792 para a prefeitura de Tauá, comandada por sua mãe, Patrícia Águiar, que foi reeleita. Robério Monteiro enviou R$ 8.135.792 para a prefeitura de Acaraú, comandada por sua esposa, a prefeita reeleita Ana Flávia. Robério Monteiro enviou ainda R$ 2.600.000 para o município de Itarema, quentinha como prefeito em 2014, seu irmão, Elizeu Monteiro.
Eduardo Bismarck, enviou R$ 6.000.000 para o município de Aracati, que em 2024 era administrado por seu pai, Bismarck Maia. Já o deputado Júnior Mano, enviou R$ 3.050.000 para a prefeitura de Nova Russas, que é administrada pela sua esposa, Giordanna Mano.
A execução dessa fatia do orçamento enfrentou entraves e deflagrou uma crise entre os Poderes em 2024. Em agosto, o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), interrompeu os repasses e condicionou a retomada à adoção de critérios para reforçar a transparência, a rastreabilidade e o controle público da origem à destinação dos recursos.
Após um longo período de negociações e a aprovação de um projeto de lei complementar (PLP), o magistrado autorizou a execução dos recursos no início de dezembro. Dino, entretanto, estabeleceu critérios de transparência.
Ainda assim, a crise entre os Poderes não chegou ao fim, já que as regras firmadas pelo STF desagradaram os parlamentares. A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu que o ministro reconsiderasse as determinações, mas ele rejeitou o pedido. O órgão, então, atuou na elaboração de portaria interministerial, a fim de garantir segurança jurídica à liberação.
2024 chegou ao fim e a novela jurídica ainda não. Um novo ano começou e agora resta aguardar as cenas do próximo capítulo.
Metrópole