Um erro cometido nos cálculos
da conta de luz resultou na cobrança de R$ 1,8 bilhão a mais dos consumidores
no ano passado. As tarifas incluíram, de forma indevida, o pagamento pela
energia da usina nuclear de Angra 3, que não está pronta e cujas obras estão
paralisadas devido a denúncias de corrupção.
A falha foi percebida após uma
ação popular de autoria do presidente do Conselho de Administração do Instituto
de Defesa da Cidadania de Formosa (GO), Geraldo Lobo, que entrou na Justiça
para questionar a cobrança.
Ainda não houve decisão
judicial, mas, independentemente disso, a Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel) decidiu retirar a cobrança das contas de luz neste ano. A medida vai
contribuir com um impacto de queda de 1,2 ponto porcentual nas tarifas.
"O valor estimado foi
repassado aos processos tarifários das distribuidoras em 2016, mas os
consumidores não sofrerão nenhum prejuízo, pois serão ressarcidos em 2017 com a
devida remuneração (Selic) a cada reajuste ou revisão. Para 2017, a previsão do
Encargo de Energia de Reserva (ERR) referente a Angra 3 foi retirada dos
processos tarifários", diz nota oficial da Aneel.
O caso é resultado de uma
trapalhada da Aneel e da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Em dezembro de 2015, a Aneel foi questionada pela CCEE a respeito de Angra 3. A
CCEE é a responsável por fazer a estimativa de custos da conta responsável por
recolher recursos do EER. Cabe à Aneel aprovar esse orçamento.
É por meio desse encargo,
cobrado na conta de luz, que Angra 3 seria remunerada quando entrasse em
operação. Pelo contrato de concessão, a usina deveria estar pronta e começar a
gerar energia a partir de janeiro de 2016. Mas o Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS) não conta com a usina até 2021. Por isso, a Aneel decidiu
autorizar a CCEE a não pagar Angra 3.
Ainda assim, a cobrança foi
feita e repassada a consumidores de todo o País, na data de reajuste tarifário
de cada distribuidora. O dinheiro ficou no caixa das distribuidoras de energia
e não foi repassado nem à CCEE, nem à Angra 3.
Para a Aneel, a CCEE deveria
ter retificado o orçamento do encargo, apresentado em outubro de 2015, dois
meses antes do questionamento, e enviado um novo levantamento de custos ao
órgão regulador, excluindo o gasto com Angra 3. Como isso não foi feito, a
Aneel incluiu o custo nos reajustes.
Já a CCEE considera que o
questionamento feito à agência era suficiente para que a cobrança não fosse
realizada, tanto que não cobrou os repasses das distribuidoras. A entidade
negou ainda ter enviado dados incorretos à Aneel. "A CCEE não tem qualquer
participação nos processos tarifários das distribuidoras, sendo estes de
inteira responsabilidade da Aneel", diz a nota.
De acordo com a Aneel, todos os
valores recolhidos a mais serão devolvidos aos consumidores, na forma de
reajustes mais baixos. Isso foi feito no primeiro reajuste tarifário autorizado
neste ano, da distribuidora Energisa Borborema, em 31 de janeiro, que resultou
na devolução de R$ 7 milhões aos consumidores. Isso será repassado para as
outras concessionárias na data do reajuste. Para os clientes da Eletropaulo,
por exemplo, será em julho.
Projeto do governo militar,
Angra 3 teve as obras paralisadas em 1986. O empreendimento foi retomado em
2009 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e deveria ficar pronto em
2014, mas sofreu novos adiamentos.
Em 2015, as obras foram
novamente paradas, devido a problemas financeiros da Eletronuclear, subsidiária
da Eletrobras, e denúncias de corrupção descobertas no âmbito da Operação
Pripyat, um dos braços da Lava Jato. Vice-almirante da Marinha, o ex-presidente
da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva foi condenado e preso por
envolvimento no esquema.
(O POVO)